
A maioria dos adultos recorda-se de alguns momentos que passou na cama dos pais: quando teve aquele pesadelo, quando acordava cedo ao fim-de-semana e ia lá ter com eles - Também haverá quem se lembre de dormir noites seguidas com pais, irmãos ou avós por medo do escuro ou simplesmente pelo hábito de dormir com companhia. Talvez alguém se recorde ainda da recusa em ir dormir a casa de um amigo porque teria de dormir sozinho...
Muito se tem dito sobre as crianças que dormem por rotina com os pais (cosleeping) e as opiniões dividem-se. A grande maioria refere a crescente indisponibilidade para os filhos após um horário laboral extenso e esgotante e a enorme culpabilidade por não conseguir dar-lhes a atenção de que tanto necessitam.
Como forma de apaziguar aqueles sentimentos e porque estão demasiado cansados para se levantar de noite a cada chamamento da criança e enfrentar a birra que se segue por não querer fi car sozinha, optam por a levar para a cama do casal. Se esta decisão for rara e circunscrita no tempo, não é penalizadora, mas não deverá ser assumida como a forma preferencial de resolver os problemas de sono da criança, pois embora seja a mais fácil (por evitar confrontos) é das que maior impacto terão a médio/longo prazo, tanto na criança como nos pais.
Estes últimos acabam por desenvolver perturbações do sono associadas à dos filhos, com alterações no funcionamento global.
Observam-se características comuns nas crianças que dormem sistematicamente acompanhadas: são mais inseguras, dependentes (sobretudo da figura materna), ansiosas, com dificuldade em tomar decisões e com medos diversos, geralmente generalizados a vários contextos e pouco adequados à idade.
Verificam-se ainda repercussões a nível da socialização, pois recusam dormir fora de casa por não se sentirem capazes de adormecer sozinhas e temem que os colegas as ridicularizem se descobrirem esta «fraqueza». Encontramos
depois adolescentes emocionalmente mais frágeis e excessivamente dependentes do adulto.
Se, perante os medos, os pais não conseguem dar uma resposta que ajude a criança a enfrentá-los e optam por a levar para a sua cama, ela não se sentirá capaz de se acalmar sozinha ou de adormecer tranquilamente. Quanto maior o medo, maior a recusa da criança em fi car na sua cama e também maior a necessidade do conforto, pelo que solicitará constantemente a ida para a cama dos pais, que lho permitem porque precisam de descansar.
A mudança para a cama dos pais acontece geralmente à custa de um deles, que acaba por ir dormir para a cama da criança por não conseguir reclamar a sua. Adivinha-se então um impasse na relação do casal, que vê perturbados os raros momentos a dois, factor causador de stress e de discussões.
Por outro lado, se optarem por dormir todos juntos, ninguém dorme tranquilamente, porque muitas crianças «não param de se mexer a noite toda» e as camas são geralmente feitas para duas pessoas...
Apesar de toda a polémica à volta do cosleeping, o mais importante é garantir que tanto a criança como os pais beneficiem da quantidade e da qualidade de sono adequadas.
Uma boa noite será mais bem conseguida se a criança aprender desde cedo a dormir tranquilamente na sua cama, em quarto próprio (ou dividido com um irmão), sendo este o seu refúgio e espaço pessoal. Para tal, há diversas estratégias para que uma perturbação do sono na criança não se estenda ao casal e altere toda a dinâmica familiar.
Ao se estabelecer que a criança deve adormecer e dormir sozinha no seu quarto não se pretende deixá-la chorar até se cansar, com medo e assustada e com os pais angustiados por não irem ao encontro dela; pretende-se, sim, que o dormir na própria cama seja encarado como parte da rotina diária, em que a criança se sente tranquila e segura porque sabe que se precisar dos pais, eles estão a dois passos de distância.
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